26/11/2009

One, Two, Three....Viva la Algerie!

Este é um grito de um povo em êxtase por se ter apurado para o Mundial de Futebol de 2010 na África do Sul. Há 24 anos que não se apuravam, e ainda por cima, com uma vitória sobre um eterno rival, o Egipto. Na rua a loucura dura há uma semana. Começou antes do jogo e após 3 dias do apito final ainda ouço as buzinas desalmadas na rua. Senti que esta ocasião era de facto de especial para este país, ultrapassando mesmo os limites futebolísticos e entrado no campo político e empresarial. Por isso decidi ir contra todos os conselhos que tinha, e desloquei-me a um ecrã no centro de El Oued para acompanhar o jogo “mata-mata” com o Egipto. Um ambiente tenso, e facilmente inflamavél.! Queria apenas observar as pessoas e aqueles ares apreensivos num país que parou totalmente por causa do jogo. Bastava-me presenciar um golo. E aconteceu. Foi golo da Argélia e não tenho palavras para descrever a felicidade daquelas pessoas. São festejos totalmente puros, a roçar os primatas! São brutos. Estou em África e não me posso esquecer disso. No Sudão, local do jogo escolhido por sorteio, há pessoas no estádio que desmaiam enquanto no Egipto outras morrem e em Argel empresas egípcias são queimadas. O ódio pelos egípcios é evidente. Vi bandeiras a serem queimadas no meu rua, e soube que todos os expatriados egípcios na Argélia tiveram de ser evacuados. Na rua, toda a gente celebra. Eu também - Não vão eles pensarem que sou do país das pirâmides!
Ir trabalhar no dia seguinte, foi uma aventura. Parece que declararam feriado nacional e as pessoas bloquearam as estradas não deixando ninguém passar. Até as mulheres estão na rua o que para mim, já é sinónimo de festa! Tudo está decorado de verde e branco. O orgulho argelino está alto. Nas ruas as crianças saltam para dentro do meu carro como se fosse um transporte público. São tantos que parecem as moscas que me massacraram durante o verão. Berram desalmadamente o “one, tow, fee…viva l´Algerie”, com uma pronúncia cómica. Para a maior parte deles, estas foram as primeiras palavras em inglês que alguma vez falaram…
Para mim este jogo de futebol foi o culminar de um dia totalmente sahariano que acabara de passar. Tinha sido convidado para um churrasco e por isso passei o almoço comer camelo com as mãos e no chão, a fumar chissa, a beber o chã do Sahara, e até a cozer algo, que eles chamam de “mellá”, debaixo da areia aproveitando o calor da fogueira. - Pode parecer porco ou até desconfortável, mas o “le petit Chameaux” foi das melhores carnes que alguma vez provei…
Imagino este país ou estas pessoas caso tivessem sido derrotados… Haveria problemas quase decerteza. E pior.
Aguardamos agora pelo sorteio dos jogos do mundial, esperando para bem de muita gente que a Argélia não tenha a sorte (ou azar) de ficar no grupo da França - Aí sim, há problemas sérios....

Fui à Tunisia!!! Mas pouco tempo....

Depois de várias tentativas e através da melhor invenção deste século, a internet, facilmente consegui sair da Argélia, cruzar a Tunísia, apanhar um barco e chegar à ponta mais extrema de uma ilha mediterrânica no sudeste tunisino, a Ilha de Djerba..
Demoramos cerca de 07 horas, mas podia ter demorado menos não fosse a eficiente duane argelina ou estarmos na altura mais difícil do ano para o mundo árabe - o Ramadão.. Espero algumas horas sentado num banco de madeira antigo para que me carimbem o passaporte e confiram os documentos, enquanto constato que têm passado por aqui inúmeras excursões de europeus a avaliar pelos autocolantes de empresas ou grupos que estão nas paredes gastas do edifício.

Lá passamos a fronteira e fomos até Tozeur onde estaria o nosso Ford Fiesta à espera para seguirmos estrada fora até Gabes na costa Tunisina. A parte inicial da estrada é a mais impressionante e a razão principal que me fez escrever alguma coisa sobre interior tunisino. Começa no oásis em Tozeur e termina em Nagga. É uma recta sempre igual sem absolutamente nada à volta, excepto, sal. Sim, são mesmo 110 km em que a única coisa que vejo é sal. A pouca água do lago Chott El Jerid evapora e a secura deixa transparecer a esbranquiçado sal tornando o visual único e inóspito. Está tudo branco. É uma planície totalmente plana e tão grande que parece que pousaram um espelho baço sobre a terra. Parece até que céu está mais perto ou flutua. Distingo a linha do horizonte porque as nuvens parecem estar pousadas no fundo. O visual é espantoso, tem a cor de leite, e tenho a sorte de passar nesta zona às horas que o sol se estar a pôr. A teoria de origem de todo este sal é a mesma que se aplica aos Salares na Bolívia ou no Chile, por exemplo, o Salar de Atacama. Neste caso, o oceano que aqui existiu posteriormente sumiu, foi o mediterrâneo, deixando apenas o salitre, e o panorama excepcional de um lago situado a 16 metros abaixo do nível do mar.
As cores que se formam, a forma harmónica que as nuvens baixas têm, a profundidade do campo de visão e os reflexos provocados pelo branco salgado, logo me fizeram explorar as várias opções manuais da minha nova máquina fotográfica que finalmente, comprei.

A viagem continuou sem problemas até Gabes cruzando populações um pouco mais limpas e evoluídas que as argelinas e, quando menos se espera, em nenhures, observo transformadores da EFACEC.

Após atravessar o ferryboat para a Ilha de Djerba, era tempo de procurar La Fidele, o Club Med que optei escolher para passar o fim-de-semana.
Do fim de semana nada posso adiantar que vos interesse. Não estava no Magreb. Definitivamente estava na Europa, mais propriamente em França, na Suiça ou na Bélgica. Escolhi o melhor local que poderia ter escolhido em toda a ilha para descomprimir. La Fidele é conhecido por atrair jovens europeus e sua animação. A praia é boa, a água do mar é quente, e o ambiente é interessante. Confirmo, e recomendo! A quantidade de gente bonita que vi, fez me perceber os milhões que o estado tunisino tem investido no seu turismo, são valiosos e merecidos. Mais um local por explorar! Aconselho.

O regresso foi normal excepto aquela cáfila de dromedários que vagarosamente passava na estrada. Às 19.00h é que é as coisas se tornam mais complicadas. Esta é a hora que o mundo muçulmano pára, pois é tempo de se sentar à mesa. Para quem não sabe, no Ramadão enquanto houver luz do dia não se pode comer, fumar, beber, nada! Só mesmo respirar. Passei praticamente o Ramadão todo aqui, e desde já adianto, que é uma experiência, no mínimo, diferente. Toda a rotina do país é alterada em função da alimentação, da reza e da lua. Todos os serviços abrem e fecham a horas estranhas e às 04.00h a cidade já tem movimento de hora de ponta, enquanto por exemplo, às 14.00h, não se vê uma alma viva na rua. Tem a duração de um mês e só termina assim que a lua nova o determinar, nunca se sabendo o dia exacto. E quem decide? Existem uns observadores de lua que o decidem anunciando publicamente o dia, começando assim a festa durante dois dias seguidos. O país fica doido.

Nesta viagem de regresso da Tunísia, chego à fronteira tunisina foi às 18.50h. Com a fome a apertar, os policiais tunisinos despacharam tudo em 10 minutos enquanto na fronteira argelina chegamos precisamente na hora de “manger”. Garanto-vos que nossa presença ali era inexistente aos olhos deles. Senti-me um camaleão. A esta hora não vale a pena. Temos que esperar seja para que o for. O nosso chaffeur, mal a luz do dia começa a dissipar, come duas bananas em 10 segundos com uma vontade tal que me deixou espantado para não dizer enojado.
De resto, a viagem continuou até El Oued sem problemas, com aquela musica árabe aos berros.
Poderia falar de muitos episódios que fui tendo durante o Ramadão, mas ficará para uma próxima.
Para já só queria deixar escrito que, finalmente consegui ir à Tunísia!

A minha ausêcia

Queria apenas pedir desculpa pela minha ausência. Houve férias pelo meio, houve idas e voltas a Portugal e, principalmente, avarias no computador, que não me permitiram escrever. Parece que afinal, há bastante gente que lê estas coisas insignificantes....

Deixo para já, uma frase de livro “No teu deserto” de MST, que li, sobre precisamente, local por onde tenho andado, aliás vivido....Esse sim, é um romântico:
"Hoje em dia já ninguém vai ao deserto. Os fundamentalistas islâmicos, como os de Laghouat tornaram-se sanguinários e incontroláveis, e mesmo os próprios tuaregues revoltaram-se contra o poder de Argel ....Mas a razão principal não é essa: A razão principal é que já não há muita gente que tenha tempo a perder com o deserto. Não sabem para que serve e, quando me perguntam o que lá e eu respondo "nada", eles riscam automaticamente essa viagem dos seus projectos. Viajam antes em massa para onde toda a gente vai e todos se encontram"....”Todos têm medo do terror do silêncio e da solidão e vivem bombardeados de telefonemas, emails, facebooks, sms, etc....." ..”Falam sem cessar em vez de se encontrarem”…”É por isso que vivem esta estranha vida ,pois embora julguem ter o mundo aos seus pés, não aguentam um dia de solidão

Pois então fiquem a saber que nem toda a gente pensa assim: No próximo mês irei ter visitas e aproveitarei para ir até Tamarasset, no sul do Sahara argelino, na fronteira com o Mali e Niger, onde dizem estar um dos lugares mais inóspitos do planeta - Vulcôes no deserto - umas das unicas zonas desérticas que é vulcanica!

12/08/2009

Preciso que lembrem que tenho sorte....

Penso que o que vou escrever, escrevo porque sei. Escrevo porque vivo aqui. Escrevo porque sei do que falo. Não escrevo porque visitei, me contaram ou li. Escrevo porque posso falar sobre um dos local mais inóspitos do planeta, que só se conhece quando é vivido e não visitado. Tento descrever o que por vezes é indescritível. Tento falar sobre o que vem para lá o imenso mar de areia que me rodeia, mas de facto, não consigo.
Em Outubro faz um ano que visitei pela primeira vez esta zona. Nessa altura, o choque cultural enevoava as minhas tentativas de descrições. Irritado, criticava e lamentava sustentado no cepticismo que circulava no meu sangue. Agora habituei-me e vivo a rotina de uma civilização com um contraste abismal da nossa, contemplo as paisagens enigmáticas e radiosas que me rodeiam, os hábitos das pessoas, e absorvo de maneira diferente.. Tento escrever aquilo que sinto. E sinto que sou das poucas pessoas que posso falar sobre esta cultura conservadora muçulmana pautada pela temperatura, abarcada no deserto do Sahara, e iluminada pelo incansável Sol que insiste em ser cada vez forte. Já tentei descrever a imensidão do silêncio do deserto, o frenesim das Sextas-feiras santas no mercado do centro, mas acreditem, é difícil
Acho que escrevo (ou melhor, tento) porque gostava de poder transmitir o que se sente no deserto. É nada. É vazio. É absoluto. É imponente. Sei lá! Não consigo. Talvez mágico? Escrevo porque gostava de contar que, apesar das dificuldades, sinto-me um sortudo por ter o privilégio de ver o nascer do sol atrás de gigantes dunas do Sahara no dias mais claros. Escrevo porque tenho a necessidade de partilhar a magia do silêncio sepulcral dos meandros do deserto acompanhado das milhares de estrelas que brilham no céu que raramente tem nuvens. É grande e fascinante. Entendo porque me dizem que quem conhece o deserto do Sahara, nunca mais volta a ser o mesmo. Entendo estas frases feitas agora.
O trabalho e as dificuldades do dia-a-dia fazem-me por vezes esquecer o que está à minha volta. É preciso que me lembrem de vez em quando que tenho a sorte de presenciar estas coisas.
Aconteça o que acontecer, esta estadia está a mudar a minha vida, fez-me crescer e entender que a tolerância, o equilíbrio ou a serenidade são conceitos importantes. Fez-me perceber que o fim temporada é o inicio de uma outra. Fez-me perceber que preciso de conhecer o resto do mundo e conhecer novos valores para evoluir como pessoa.

Estamos em Agosto a poucos dia do Ramadão. A vida começa às 05.00h. Pela rua, pelos cafés, nas padarias, tudo está aberto. A rotina de um mais um dia destas pessoas já se sente quando no resto do mundo só se pensa em dormir. O Sol nasce e a temperatura triplica. Normalmente chega passa dos 46ºC e nos dias piores estão 50ºC. Tudo fecha às 10.00h, quando tudo está a abrir em Portugal. Voltam a abrir às 18.00h, quando o sol se começa a pôr e tudo está a fechar em Portugal.

Por mais que tente escrever o que é este local, não consigo. Não tenho habilidade para tal, mas a humildade suficiente para o admitir. Sou novo. Precisamos de crescer. É preciso que me lembrem e já agora, me expliquem, como é que se pode descrever o que vem para além do nada?

















18/07/2009

A Norte........

Enquanto o Mundo se preocupa com o funeral de um cantor, ou com uma gripe praticamente inexistente que alimenta os bolsos de alguns magnatas, eu preocupo-me apenas com o calor. Ontem estiveram 46ºC. O calor traz um significado diferente à velocidade do tempo. Garanto que não é igual ao resto planeta. Condiciona não só a maneira como as pessoas vivem, que não me canso de insistir de que é literalmente no chão, como também o lento ritmo de vida. Eles estão habituados, mas eu não! Por isso, após um mês seguido aqui, começo a sentir formigueiros pelo corpo todo. Tem que sair daqui!. Foi o que fiz. Ou melhor, que tentei fazer. Decidi que este fim de semana iria à Tunísia. Para isso tive que conseguir uma procuração para passar com o veículo alugado, e claro, ter tudo o resto em ordem. No entanto, só cheguei à linha divisória dos dos dois países. Só espreitei o país vizinho. Tal como se fica à porta de uma discoteca, eu fiquei à porta dum país. Morri na praia. Cheguei inclusivé a ter o passaporte carimbado que entrara na Tunísia, mas quando cheguei aos serviços aduaneiros, informaram-me que teria que ter o Visto de Residência Argelina para poder conduzir um carro alugado de matrícula argelina fora do país.

Sentado num banco de madeira vou esperando as noticías da "apeadela". Atrás de mim uma cópia de um aviso. O único nesta fronteira. O da famosa gripe suína - Sorrio e penso: Passam por aqui inúmeras bombas, terroristas e doenças que todos os dias que matam milhares, como a tifóide, as hepatites, ou simplesmente a pobreza que resulta das "sábias" decisões de pessoas, e o único aviso que vejo aqui é o da gripe suína, que resulta dum animal que é proibido neste país.! Enfim....

Noutro continente já passei fronteiras com “gratificações”, mas aqui não podia arriscar essa afronta. As soluções escasseavam. Conclusão – A Argélia adora-me e não me deixa sair daqui. África tem destas coisas.
Ainda pensamos em deixar o carro ali, passar a pé, apanhar um táxi e depois alugar um carro, mas o facto de não possuirmos dinares tunisinos, estarem 45 ºC e localizar-me simplesmente no meio do deserto, fez com que tomássemos a decisão de ir dar uma volta, mas pela Argélia.





De carro e sem mapa, fomos para Norte, como que à procura de não sei bem o quê. Talvez de ares mais frescos, de aventura, ou simplesmente porque não queríamos voltar ao buraco de El Oued. Basicamente fomos conhecer um pouco melhor o 11º maior país do Mundo. A estrada era mais uma daquelas rectas que de vez em quando cruza pequenas vilas, estas ainda mais pobres do que tenho visto. Vivem apenas da agricultura e do comércio base. Olham-me estranhamente. Todo o visual faz-me lembrar que é neste tipo de sítios que os terroristas responsáveis pelos atentados de há duas semanas devem estar escondidos. As patrulhas policiais são muitas e com carros blindados, mas eu já me habituei à presença destes amigos. O que não me habituei foi a estar meio perdido em locais como este onde praticamente sou “surdo” e analfabeto. Agora posso dizer - “Mãe, se me acontecia alguma coisa ali no meio, estava bem lixado!”
Foi muita a estrada percorrida, muitos km, quase sempre numa recta até chegar à zona das montanhas. Horas sem ver ninguém. Quase adormeci e me espetei contra uma barreira policial de tanta monotonia que a estrada é. Não fosse o Nelson a dizer “Oh, Oh!, tu tem cuidado, Fod***, agora vou eu a conduzir!”, e estaria com algures na Argélia a ser tratado.
Informações erradas ou placas de indentificação mal colocadas fez com que fizéssemos um km a mais. Normal. Encontrar alguém com quem conseguisse comunicar já era uma aventura, e quando conseguia, simplesmente era enganado, que acredito que não fosse por mal.
Acabamos por chegar a Batna, uma cidade a norte. Esta não tem nada de especial, mas pelo menos é limpa, asseada e tem ruas de alcatrão. O centro é acolhedor e até agradável, mas em dez minutos, está visto! Fomos perguntando e encontrei uma agência de turismo que me arranjou finalmente um mapa da Argélia, mas datado de 2001. Normal. Descobri que aqui bem perto existem dois locais património mundiais da Unesco. Umas ruínas romanas, gigantescas – Timgad, e os "Balcons de Ghoufi", que é um canion simplesmente espantoso.
Timgad, a cidade romana construída 100 anos d.c, ainda se mantêm intacta e distingue-se perfeitamente o teatro, que chegou a ser o maior de todo o mediterrâneo, o arco do Trajano construído com pedras do Egipto e por franceses, os túmulos, as casas, as ruas, etc. Foram inúmeras as guerras entre Berbers – conhecidos na altura pelos vândalos do deserto, Árabes e Romanos, e as ruínas estão intactas. É incrivél este local. As ruas e as casas está em perfeitas condições notando que aqui se passou muita história, muitas guerras. As formas rectangulares das casas e vista para uma lagoa, fazem com que este local seja especial. Uma viagem no tempo, que escuso de entrar em detalhes, mas que aconselho para quem gosta.





Agora já tinha mapa (de 2001!) e até indicações de um Hotel com piscina a caminho do Canion. Falei duas vezes para o Hotel para me certificar que tinha piscina, mas quando lá cheguei, reparei a piscina está lá, masque não tem água. Normal. Assim decidi que não ficaria ali, nem mais um minuto e seguimos...Continuamos agora por estradas no meio das montanhas até chegar a Ghoufi. Finalmente as paisagens secas e áridas do deserto foram substituídas por montanhas, vegetação e até um pouco de chuva. Ainda demoramos pelo menos 3 horas em curvas sinuosas até lá chegar. Passamos buracos, campos de cultivo, pastores e muitos casamentos! Foi o um dia que mais casamentos vi. Aqui no norte festejam-nos de uma maneira um pouco diferente do que mais a sul onde moro. Também estão fora dos carros aos berros, batem palmas, fazem barulho, etc, mas há também os espertinhos que andam aos tiros com caçadeiras ou espingardas. Dão tiros para o ar com o carro em andamento. Questiono-me de qual será a piada de levar uma caçadeira para um casamento. Será que telefonam ao amigo: "Olha, levas tu ou levo eu a espingarda!?" - Da mesma maneira que não entendo porque é que só os homens vão para as dunas dançar sozinhos ao som do rádio reles do carro, ou porque é que eles passam a vida no chão ou mesmo do que conversam quando lá estão, esta é outra coisa que nunca irei saber a resposta, mas que faz parte desta cultura tão diferente da nossa.





“Balcons de Goufi”, é um espanto. Valeu a pena fazer estes quilómetros todos para ver este canion. É difícil explicar, mas o canion é como se fosse um vale onde no centro está um oásis. O verde da mata do oásis lá no fundo contrasta com o castanho seco das paredes verticais que o rodeiam. Nestas, existem ruínas de casas que provam que ali viveram, e dizem ainda viver, os Berbers. São inúmeras casas e ao longo de 90 km. Este inóspito local não é bonito pela grandeza do canion que tem apenas 1200 m de altura, mas sim pelo facto de existir um oásis no fundo da montanha em perfeita harmonia com as antigas vilas que situam nas paredes. Dizem ser um local visitado por muitos famosos, e eu acredito apesar de falta de serviços e infra-estruturas turísticas na zona. Percorrer os caminhos entre as ruínas e parar um bom bocado nos inúmeros miradouros que ali existem, fazem com este local fosse digno de ser turístico. Fez-me por vezes lembrar o que senti em Machu Pichu no Peru, mas numa dimensão mais pequena e num contexto bem diferente. Vejam bem..MP é uma das Sétimas Maravilhas do Mundo....
Pergunto-me como é possível em 2009 um lugar histórico deste calibre, estar tão abandonado...





Voltamos por Birkra, fomos parados, quase obrigados a andar com escolta, perdermo-nos de noite, mas acabamos por voltar a Oued Souf.

Mais uma vez fico com a certeza que este país tem um potencial turístico gigantesco que muito turista adoraria ver, mas faltam condições!. Ficam novamente o convite, para quem não se importa de deixar o conforto físico para trás....








NORMAL!

O uso desta palavra neste país começa a deixar ligeiramente nervoso. Ela é usada em todo o tipo de situações. Penso que é das poucas palavras que pronuncia da mesma maneira em Português, Francês e Árabe. Se eu perguntar “Como é que se vai para Biskra?”. Resposta - “Normal”. “Qual é a melhor estrada?” Resposta - “Normal. “A que horas é que nos encontramos”? Resposta: Normal. “Isto é preto ou branco?” Resposta: É Normal!.....Quando não sabem a resposta, dizem Normal.
Digo-vos, já perdi anos de vida com uma palavra. Em situações de stress, quando as coisas não estão a funcionar e no fim ainda me respondem “normal”......Enfim, tenho apreendido a ter paciência!
Já acho normal rir-me quando me respondem normal.

Noutro dia uma camioneta encostou-se à minha carrinha e partiu me o retrovisor. Saí e tentei comunicar com o árabe. É impossível. Depois de muita discussão de gestos, do ambiente até ter ficado tenso quando disse que ele teria que pagar, o árabe pega no retrovisor partido e tenta encaixar. Mesmo partido ele até se segurou. Ele olha para mim e diz: – “Normal, Normal...” Foram as únicas palavras que entendi durante os 5 minutos que tentamos discutir. Fiz novamente o sinal que ele teria que pagar e ele saca-me o papel com o numero de telefone que me tinha na mão, e chama mais amigos. Eu sozinho, comecei a ver que poderia dar para o torto.
Conscientemente, pirei-me!
Normal.

24/05/2009

Mais a Sul...



Ainda não é desta que vou escrever sobre o meu trabalho. A maior parte das vezes escrevo precisamente para relaxar do trabalho e desligar. Mas fica prometido.

Desta vez escrevo porque viajei mais para sul, para as profundezas do deserto do Sahara e descobri que afinal El Oued não espelha a cultura tradicional Sahariana. Descobri que El Oued é uma cidade sem personalidade. Não é como Argel - que é feio, desorganizado e quer imitar uma cidade europeia, nem é como os locais do sul do Sahara representativos de como há muitos lugares onde o desenvolvimento ainda não chegou, da ancestralidade rural e tradicional desta zona.

Viajei de carro durante umas 6 horas até uma zona chamada Ghardaia.

Pelo caminho passei pelas diversas paisagens emblemáticas da zona - areia vermelha, areia amarela, terra, planícies gigantescas e cidades perdidas no seu tempo. Foram horas sem ver uma alma viva e de ar condicionado ligado.
Ao fim de algumas horas de percorrer a mesma estrada começamos a avistar as primeiras indicações que nos estamos a aproximar de Berriane. É a primeira grande vila que conheço este fim de semana e deixou-me ligeiramente desconfortável e até um pouco sobressaltado. À entrada da cidade somos recebidos por inúmeras barreiras policiais, desta vez policia de choque armados do pés à cabeça. São muitos. Parecem sentinelas, e vigiam atentamente a cidade. O clima não é muito confortável para um loirinho com ar de europeu. Cheira a guerra e o ambiente está tenso. Somos obrigados a diminuir a velocidade, e somos observados. A cidade, totalmente rústica e tradicional é confusa, com muita gente na rua misturada com as forças policiais. Entretanto contam-me que existem conflitos étnicos muito sérios nesta zona, e percebo o porquê deste exagero de segurança.
O Akli, nosso colega, pára o carro para ir visitar uma amiga, e eu decido sair e dar uma volta sob o olhar atento dos nativos e dos policias. Num dado momento estes vêm ter connosco de arma em punho. Primeiro tentam comunicar e depois confiscar a nossa máquina fotográfica explicando que a lei proíbe de tirar fotos em locais como este, principalmente a eles própios. Fazem uma revisão das fotos já tiradas e mais uma vez a simpatia dos portugueses, o Madjer e o Cristiano Ronaldo, por vezes sacam sorrisos salvadores.

Ghardaia e Beni Isguen, são cidades situadas no conhecido Vale do M´Zab, Património Mundial, com linguagem própria, o Tumzabt, e com uma derivação mais acentuada do islamismo. A região tem mais de mil anos, as mesquitas são construídas de areia e terra e ainda se mantém complemente intactas. Pela primeira vez na Argélia não noto vestígios da colonização francesa. Parece que entrei noutro mundo. Na rua reparo que todas as mulheres vestidas de branco da cabeça às pés têm um só olho à vista (a Haik) e homens usam roupas estranhas como calças tipo Aladino e toucas pousadas na nuca. Estes só permitem que elas olhem através de um olho depois de casar. Imagino que não haja muitas conversas do género– “ Ontem vi a tua mãe no centro!”. Estão todas de branco e são indistinguíveis.
A cidade, localizada no Vale do M´Zab, é totalmente rústica, e esta sim com personalidade, uma arquitectura e organização urbanística totalmente diferente do que vi até hoje não só na Argélia como em outros locais. Tudo é construído com areia, é castanho e amarelado, há muito artesanato, e as ruas e ruelas são autênticos labirintos sombrios e estreitos que no passado serviam para confundir os invasores. As próprias mesquitas situadas nos topos das montanhas e que serviam de vigia e pontos de ataque, são de dificil acesso. Inclusivé aconselham um guia, mas acho exagero.










O artesenato e agricultura são as principais fontes de rendimento das numerosas familias e o centro retrata isso mesmo. É dia de feira, logo, a confusão habitual onde se nota que já estou mais próximo da verdadeira Àfrica. Há muitos negros e estranho vê-los a viver como muçulmanos!
Comi a comida típica do local, bebi o famoso chá, deu um passeiozeco, e jurei comprar uma máquina fotográfica de jeito. Teria tido grandes fotografias neste inóspito local.

Poderia estar aqui a contar inúmeras coisas sobre esta zona, mas também não quero cair no erro de ser um LonelyPlanet.

Posso apenas dizer que pela primeira vez aconselho a virem cá e conhecerem esta zona. Já conheci o Deserto da Atacama chileno, e se tivesse que escolher, seria este! Não por ser melhor ou pior, mas pelo impacto da diferença cultural que se sente.

Deixo assim aqui o roteiro deste mês.

Optei por nem referir que fui a Argel de tão feio que é – Só valeu a pena porque vi mulheres destapadas, normais para mim, diga-se muito bonitas, e comi em bons restaurantes.
SALAMALEMKOM!

09/05/2009

Louyiz Loyto

As ideias e surpresas vão escasseando. O que dantes me fazia escrever para não me esquecer, agora vai deixando de ocorrer. Estou outra vez na companhia da areia e do sol. Como diz o outro, isto é uma praia, só que para dar um mergulho tem que caminhar 1500 Km. É uma praia maiorzita.
Cheguei da Alemanha e de Portugal e agora estou na Argélia depois de duas semanas a viver à rico onde quase enjoei lavagantes e lagostas, onde aprendi como se vai às melhores marisqueiras e se pede o melhor sem olhar para o preço. Ter que passear o Argelinos por Portugal e pela Alemanha tem coisas boas. Fui guia turístico em Óbidos, no Porto, fui tradutor na Alemanha e até Jesualdo Ferreira fui por momentos.

Por essas e por outras caio na tentação de escrever vulgaridades que toda o ser humano sabe, lê ou ouve falar, correndo o risco de ninguém ler isto, por ser simplesmente mais um texto, mais umas linhas banais. No entanto, não resisto. Falo das diferenças abismais entre estes povos, as diferenças que vou vendo. Entrar num avião no local onde as pessoas praticamente moram no chão e comem com as mãos, e sair do avião num dos locais mais evoluídos, organizados e disciplinados do planeta deixa-me, no mínimo, irrequieto. Neste extremo, nos arredores de Frankfurt, fico a dormir num antigo Hotel Palácio em frente ao um lago rodeado de uma vegetação intensa, limpa, sombreada e verdejante, uma reserva natural - Koblenz tem tudo o que espelha a Alemanha. É Domingo, as famílias passeiam calmamente na trilha entre a vegetação e o lago, e tudo é tão ordenado que parece que é de propósito, como se estivesse a apreciar um pintura. Até os patos que chapinam na água parecem estar ali para nós vermos. As pessoas estão nos locais onde deviam estar, o lixo não existe, as árvores e arbustos estão de tal maneira recortados que parecem ter sido educados desde pequenas, nada está fora do lugar, nada é ao acaso, não há uma única linha contínua de estrada gasta, não há falhas nem imprevistos, os carros de alta cilindrada são aos pontapés e respeitam rigorosamente a velocidade indicada no GPS. Enfim, “ à Alemão”. Todos nós sabemos ou ouvimos falar desta organização Alemã. Eu pelo menos já conhecia.



Portugal está no meio. Como todos sabemos, somos Tugas, e escuso de explicar. Já agora, adoro ser Tuga, adoro Portugal e adoro tudo o que é Português. Acho que até já gosto do famoso busso português.

No extremo oposto, a Argélia, mais propriamente esta zona onde moro. Tão extremo que basta ler alguns textos antigos para perceber as “ ligeiras diferenças”. Tão extremo que aui "não sou mais um", que já não passo despercebido, principalmente entre as forças policiais e população da zona. Digo isto pois quando deixo o avião no aeroporto de Birkra e enquanto espero as malas no “gigante” tapete rolante de 4 metros , cinco homens fardados, armados, da policia especial, vem ter comigo e perguntam se sou o “ Louyiz Loyto”, escrito num papel amarfanhado – Penso que é Luís Leite” em Argelino. Digo que sim, e fico a saber que dois jipes da policia irão fazer a escolta do Louyiz Loyto até casa, durante as próximas horas no típico estilo aparatoso duma escolta. Sim, com sirenes e tudo! Neste país a escolta é obrigatória para expatriados, mas normalmente ninguém a quer pois chama a atenção. Por isso evita-se. Foi o que fiz. Continuo sem saber quem a “encomendou” para nós, mas depois de umas conversas na esquadra local, convencemo-los a fazer a viagem para El Oued sem a companhia de sirenes e jipes da polícia na estrada sem fim, onde desta vez as lagoas secaram e deixaram o sal à vista.


Como é que a uma distância de 4 horas de avião, tudo é tão diferente?





Neste momento estamos em Maio. O que em tempos para mim era uma necessidade, agora deixou de ser. O sol e o calor já começam a dar um ar da sua graça. Para já só estão 32 graus de média e não vejo uma nuvem há muito tempo. Terei que me habituar. O pior está para vir.

A próxima vez escreverei mais “banalidades” destas quando vier de férias em Junho. Só não sei é donde, mas isso, os meus amigos decidirão no dia anterior.

13/04/2009

Curiosidades

O gasóleo custa 0,11€ por litro. A 250 km está uma a maior reserva petrolífera da Argélia, a que serve grande parte da Europa. Hassi-Messaoud é, como as outras cidades todas, pobre e enfiada no meio da areia. Mas no aeroporto há mais jactos privados que aviões comerciais.


Quem circula na rotunda não tem prioridade. É ao contrario do que estamos habituados. Logo, em quase todas, há pelo menos 3 sinaleiros.

Fui ver um jogo de futebol local e entrei para bancada pelo tunél com os jogadores e o árbito.
Penso que fomos mais o centro de atenção que o própio jogo.

Toda as estradas que existem em El Oued, estão atulhadas de lombas para se controlar a velocidade. Irritante. Mas quando veio cá o presidente, essas lombas são retiradas, para passado uns dias, se voltar a pôr e ainda maiores. Nota: As lobas são em cimento!


Não existem bolachas salgadas.


Já me perguntaram se o Pai Natal existe ou não existe. Não era uma criança, pelo contrário, era bem mais velha que eu.


O fim de semana é à Quinta e Sexta-Feira. Sexta Feira é dia santo. Não há carne de porco.


Há visuais inesquecíveis. Mas não tenho máquina fotográfica.


Em casa, descobri que em determinadas horas, quando não há água da rede, tem que fechar a torneira da água fria do chuveiro, para ter água no autoclismo.


Os recibos são folhas de caderno, onde o valor é escrito à mão, e posteriormente carimbado. Já me entregaram um guardanapo como recibo. Não têm qualquer validade legal, como é óbvio.


Tudo o que é de “marca” é falsificado. Comprei umas Levis por 6 euros e o rádio do meu carro veio numa caixa Sony, mas o rádio não tem marca. Só à terceira vez é que funcionou. Neste momento, já avariou parte dele. Acho que vou pedir uma caixa nova à Sony.


Temos um gato mas não queríamos. Foi o primeiro gato argelino pecador. Comeu bacalhau e salpicão.


A hora não muda nunca.


Na feira vendem cd´s e dvd´s, gravados claro. Quando pergunto qual o melhor e mais típico da zona, o vendedor indica-me um e diz-me “este era terrorista..” Não posso dizer se acredito ou não, mas pela capa, desconfio.


Este mês vou outra vez e a Portugal e até a Alemanha. UUHUHUHUH!

25/03/2009

Mulheres

Passado o choque inicial, começo-me a habituar a viver aqui. Começo a perceber que todo o ser humano adapta-se a qualquer tipo de condições, e sei que existem bem piores, excepto uma mulher. Incomoda-me cada vez mais o estatuto social delas. É claramente inferior. Algumas são maltratadas, vivem amedrontadas, têm receio de que o véu lhes caia, não saem de casa a não ser para trabalhar, estão proibidas de conviver em qualquer espaço público, não têm quase opinião.
Enquanto estou num pequeno restaurante que eles chamam de “fast food”, entra uma mulher que simplesmente pede um copo de água ou uma moeda. O dono, que se situa à porta faz sinal ao empregado para lhe servir. Vocês não imaginam o esforço que a mulher fez para beber um simples copo de água. Tem daqueles véus constituído por duas peças. A peça que tapa a cabeça e a peça que tapa o rosto. Só se vem os olhos. Para beber não pode tirar véu - Põe o copo debaixo do véu, inclina-se para trás e satisfaz a sua sede entornando metade da água, mas “contente” porque não tirou a burka e enquanto os restantes clientes continuam as suas conversas. Eu fico estupefacto, eles não.
Existem outros tipo de véus. Aqueles que são um lençol gigante que tapa tudo. Tudo sem excepção. Nestes casos elas só estão com um dos olhos à vista. Não estou a exagerar. De todo o corpo, só se vê um olho, e mal!
Sei que existem sociedades muçulmanas em que as mulheres vivem uma vida normal sem este exagero, e dentro dos limites, bem. Mas aqui não me parece. Tenho amigos cubanos trabalham num hospital de ginecologia, onde muitas mães aparecem grávidas. Estas vêm de outras cidades porque engravidaram sem casar. Isto é um escândalo. Caso se saiba na terra delas, são enxovalhadas e retiram-lhes o filho optando por ir para outra cidade. Isto acontece, contaram-me eles que vivem aqui há dois anos, e sabem melhor que eu este tipo de coisas.

Por isso, minhas queridas mulheres portuguesas que tanta falta me fazem aqui, não se queixem!
Adoro-vos!

Nota: Não quero com isto causar incómodos, pois sabem que a maior parte, casadas, vivem uma vida considerada normal com a sua familia, nas suas casas, à maneira deles e tranquilamente.

21/03/2009

Algumas fotos














































12/03/2009

Tugas Cubanos e moscas

Faço a minha vida na obra. Admito que “brincar às obras” traz alguma satisfação profissional apesar de todos os problemas que envolve, que são muitos! Depois de todo o trabalho logístico, de planeamento e projecto, começar a ver as coisas a nascer no meio do deserto satisfaz-me apesar de continuar a preferir estar na praia e ganhar o euro-milhões. Para quem não sabe são 3 ETARs que estão a ser feitas, as quais estão integradas num projecto nacional argelino para recuperar os niveis freáticos do deserto do Sahara. Apesar de todos os entraves que vão acontecendo e das dificuldades para conseguir alguma coisa que funcione, já tenho internet no estaleiro. Tivemos que encomendar um satélite.

Almoçar aqui no contentor refeitório tem várias particularidades. Não tenho se quer opção. Come-se o que nos dão e entendendo o lema – “Primeiro come-se, e depois vê-se se gosta”.Num raio de 40 km não há onde comer, e mesmo que houvesse, as condições de higiene faziam com que a ASAE (se aqui existisse) entrasse em colapso.
Para além do sabor ser sempre o mesmo, existe a companhia das moscas. Estas obrigam a que cada vez que levo o garfo à boca, tenha que ter cuidado para evitar que alguma dessas amigas esteja lá pousada. Um braço é para o garfo, outro é para afastar as moscas, tornando o refeitório extremamente cómico, como se toda a gente fosse maestro por uma hora.
Hoje por exemplo não há moscas. Hoje há vento, muito vento, que nem elas sobrevivem. Tanto, que a areia levantada cobre o céu e penetra por todos os pontos do nosso corpo. Trabalhar na obra, só com óculos, a maior parte deles de neve. Quando chove, chove lama. A areia no ar agarra-se à chuva. Ficar lá fora é praticamente impossível, não se vê nada, como se fosse um dia de nevoeiro intenso.

Fico espantado que o dia de mais vento, de menos moscas, é o dia de mais portugueses. Para além de nós que estamos cá a trabalhar, apareceram mais 5 Portugueses, que viajam de mota desde Portugal. Já atravessaram a Europa, a Tunísia e vieram agora a Argélia. Penso que também quero fazer algo assim parecido, e depois penso que não sei andar mota.
Pessoal de Lisboa que veio quebrar a rotina de mais um almoço, desta vez sem moscas. Estupefactos, dizem mais uma vez, que os Portugueses estão em todo o lado, e partem novamente para o sul da Tunísia!

À medida que se vai fazendo a vida por aqui, vamos conhecendo os cantos à casa. Conheço quem me arranje camelos para ir passear, a mesma pessoa que diz que se quiser me leva às maiores dunas do sudeste do deserto onde se passará a noite a comer carne de camelo grelhada,e a contemplar um por-do-sol espetacular. Nas minhas tentativas pessoais de desbravar o deserto q apanhar as dunas mais altas, já atolei de pick up duas vezes, mas isso faz parte. Para quem gosta deste tipo de desportos motorizados aventura, este local é sem dúvida muito bom.








A rotina instala-se e começo a sentir o que é viver aqui. De vez em quando aparecem coisas ou pessoas que me fazem perceber que toda a gente está em todo o lado. Enquanto estava no edifício da Algerie Telecom para tratar da Internet, que demorou quase dois meses, ouço falar espanhol. O meu tradutor fica também espantado como é que aqui está um grupo de Cubanos e Mexicanos que trabalham na construção do Hospital na zona. O Pedro, logo me convida para o aniversário de um deles, e me pergunta baixinho se por acaso, eu bebo bebidas alcoólicas.
Rio-me!

Começo a perceber que este país, se mudar um pouco a mentalidade, poderá ser uma das potências mundiais em 30 anos. Têm tudo - Petróleo, gás natural, potencial enorme para vários tipos de turismo, mão de obra e vontade.


26/02/2009

Pente

Na caca do hotel Ritane Palace reparo que não o trouxe. Não é que tenha muito cabelo, mas se acordar e não o pentear, ele fica tipo espantalho. A solução? Comprar um El Oued. Esta tarefa parece fácil, mas não é. Comunicar é difícil e não me parece que este seja um objecto muito usual por estes lados.
Incumbi assim o meu colega que fala árabe para que vá à cidade e meu traga um..
Só o consegui no fim do segundo dia, e eis o que apareceu no estaleiro.
Irei oferecê-lo à minha querida Tiga, e agradecer a este país, por mais um momento .

Casa

Apresento a minha casa e fica desde já o convite para quem quiser conhecer o deserto do Sahara e o estilo de vida muçulmano. Vivo na zona rica da cidade.
Tem 7 quartos, nunca sei quando tenho água e ainda não percebi quando é quente ou fria. Sei que no verão só tem água quente e de noite. De dia não há água não cidade inteira. Estarão 48ºC.
Sem querer, acordo todos os dias às 05.30h da manhã porque é hora de rezar. Moro perto de uma das inúmeras mesquitas de onde sai a primeira das cinco rezas diárias, através do altifalante que faz com que toda gente de El Oued acorde. É impossível não acordar. Aconselho assim a virem no mês do Ramadão, em Setembro, onde esta melodia é tocada constantemente e repetidamente, e o povo anda irritado porque não come, não bebe nem fuma enquanto houver luz durante o dia.
Do terceiro andar da minha casa situada na rua de terra, tenho uma vista deslumbrante. A seguir ao castanho das casas inacabadas da cidade, vem o amarelo das dunas de areia - As casas que estão acabadas pagam uma taxa, por isso a opção é deixa-las por acabar.
É muito confortável e extremamente funcional. Tenho que colocar fitas isoladoras nas frinchas das janelas, pois durante os primeiros meses do ano é altura das tempestades de areia, areia essa que de tanta força que tem, penetra por todos os cantos da casa deixando o meu nariz entupido enquanto durmo.
Temos um guarda nocturno, o Xerife. Fala pouco francês, é prestavél, simpático e vai-nos contando como se vive por estes lados. Diz que só tem uma mulher, mas que os amigos normalmente tem 4. Um deles vive aqui ao lado, com as 4 mulheres e os filhos todos. Para namorarem os pais têm que falar entre eles e dar a autorização. Quando casam, é uma festa, os carros saem à rua, apitam, as pessoas batem palmas, está tudo efeitado, e até fuguetes vi a serem lançados do carro, mas claro, sempre sóbrios. Pelos menos é que o dizem. Mas eu acredito, pois para conseguir a minha primeira grade de cerveja, no mercado negro, paguei cerca de dois euros por lata!
Saio de casa e deparo-me com os homens de turbante da cabeça aos pés, que se vão habituando à nossa presença. Uns estão sentados (no chão, claro) em redor de um conjunto de pedras – talvez seja um jogo, outros passeiam parece que sem destino. São os meus vizinhos, e reforço mais uma vez a simpatia desta gente que me respeitam e cumprimentam todos os dias. Diria para já, que é uma vizinhança sossegada. Quando vou fazer o meu jogging, sinto que olham para as minhas pernas ou para as minhas sapatilhas. Noto que de todas as semanas que estive por cá, nunca vi ninguém de calções. Espero não estar a afrontar ninguém e não voltarei a ir de calções.
Tenho sempre fruta e legumes frescos. Ir ao mercado comprar estas coisas é a verdadeira aventura. É tudo por gestos. Não há um único que fala francês. Vir ao mercado é sem dúvida, uma experiência que aconselho se vierem cá. Numa das lojas, onde tenciono comprar sofás, encontramos uma das muitas mulheres policias que me pergunta de onde sou e me pergunta timidamente se me pode fotografar. Passo assim a ser conhecido entre todas as mulheres policia de El Oued.

A duas horas de carro, entro na Tunísia, onde espero ir brevemente.

As coisas aqui são bastante diferentes do que estou habituado, mas é assim.
Tem coisas boas – não há transito, está sempre sol e só me concentro no trabalho!


Saha!

15/02/2009

Aeroporto Internacional

Neste aeroporto militar que agora serve de comercial, existe um controlo policial anormal que me obriga passar para aqui o que passo todos os meses. Excesso de recursos?
Falo do número de pessoas que têm como função revistar e controlar os documentos para quem sai de Birskra em direcção a Paris.
Ainda no carro, à entrada para o parque de estacionamento estão dois polícias que me fazem uma continência e mandam parar. Rodeiam o carro em passo atento, espreitam para o interior e passado 4 segundos, sem exagero, manda-me seguir.
Estaciono o carro, despeço-me do motorista e dirijo-me para o aeroporto propriamente dito que mais parece uma paragem de autocarros dos anos 70. Na humilde entrada, tem um detector de metais e o respectivo tapete para controlar as malas onde mais dois policias me revistam e indicam que caminho devo seguir.
Dentro do aeroporto, que não é maior que metade de um corte de ténis, tem o chão em tijoleira de cor fria, as cadeiras de madeira e alinhadas em fileira, onde se pode fumar e apagar cigarros no chão, faço o check in na única bancada que existe. Aqui mostro o bilhete a mais dois policias que observam atentamente o meu bilhete. Faço o check in, mostro o passaporte, papel de saída do país, o bilhete e o visto seguindo para mais uma entrada onde estão mais dois policiais de ar sério como quem dá aquele ar de “nós é que somos!”. Estes controlam, outra vez, os meus documentos e acenam-me a cabeça. Três metros mais à frente, enfrento mais dois, numa bancada que parece uma cabine telefónica, onde me fazem todas as perguntas: de onde sou, para que empresa trabalho, onde dormi, que projecto estou envolvido, quando cheguei, etc. Depois de muitas perguntas e, mais uma vez, verificação dos documentos, carimbam-me finalmente o passaporte. Dois metros à frente, está outra cabine exactamente igual à anterior com mais dois policiais, uma mulher e um homem que espiam outra vez a minha documentação. Na mesa ao lado está mais um que me pergunta se tenho declaração de bens, por exemplo do computador. Não tenho, por isso aguardo que outro que me questiona a razão de não possuir esta declaração. Digo que não sabia, ao que me responde – “ok pode seguir”. De seguida passo por mais dois militares, mais um detector de metais, um tapete de malas (onde verificam a mochila de mão), e me revistam outra vez.
Vou para uma sala de espera, também muito humilde, com casas de banho sem sanitas, com os típicos buracos no chão e quase sem portas, onde espero duas horas que venha mais um fiscalizador com a chave da porta que dá para a pista. Quando este chega, o guarda faz sinal e todos se aglomeram à volta dele, onde mais vez, ele verifica o bilhete e o passaporte de cada um. Após passar este guarda policial formado pelas exigentes academias militares da Argélia, vou a pé para o meio da pista do aeroporto onde estão todas as malas pousadas no chão. Aqui indico a um funcionário qual é a minha mala e ele coloca-a no carrinho e aponta para mais um guarda policial com uma mesa onde, mais uma vez, a minha mochila é verificada. A seguir, outro distinto policial revista-me e finalmente, o funcionário do avião verifica pela última vez o meu bilhete e entro no avião para Paris.
Contabilizando, e sem contar com os funcionários do aeroporto ou da companhia aérea sou controlado por 19 policiais, sou revistado do 3 vezes, a minha mochila 4 vezes, passo em dois detectores de metais, e perco a conta à quantidade de vezes que olham para os meus documentos, para chegar ao avião, e nem sequer ter lugar marcado. Mas posso-vos adiantar que se quisesse transportar algo ilegal, seria extremamente fácil.
Finalmente chego a Paris, que por sua vez, está coberto de neve, e me convence que esta é de facto uma cidades mais bonitas que já vi.
Saha!

14/02/2009

El Oued é assim...




Welcome to Saara ...
Durante os últimos meses foi-se falando tantas vezes que perdi a conta. Falou-se sobre tantas coisas relacionadas, que começa a ser normal estar e viver em El Oued, no deserto do Saara. Mas não. Convém focar que estamos a falar num país cujo regime democrático não é aceite por todos. Convém não esquecer que estou o terceiro mundo, que voltei 100 anos para trás no que respeita ao desenvolvimento, ou que ainda há bem pouco tempo, o Grupo Islamico Armado (GIA) – que em tempos ano passado enviava os melhores guerrilheiros para o Iraque para lutarem ao da Al Qaeda, degolava vilas e aldeias inteiras aqui bem perto, simplesmente por não serem ou não respeitarem o Corão.

É a terceira vez que venho a El Oued, cidade no deserto do Saara que significa rio, que já existiu, mas que secou, e continuo surpreendido. Tudo é pó, areia e castanho. O regime, a cultura e as regras são claramente muçulmanas e eu tenho que praticamente viver como eles. O governo proibiu a semana passada a venda de qualquer bebida alcoólica. As pessoas rezam às diferentes horas, descalças e depois de lavarem as mãos e os pés, as mulheres estão tapadas e não saem de casa, e só se vêm homens nos cafés, se é que se pode chamar aquelas barracas de contraplacado, cafés. Nesta altura do ano, inverno, está frio, pelo que toda a gente está ainda mais tapada que o habitual. Eles usam umas túnicas castanhas cumpridas até aos pés, com carapuço da mesma côr, e elas normalmente de cor claras. Parecem tumultos que se passeiam pela rua, como zombies, como fantasmas todos vestidos de igual, ou como qualquer animal rastejante que se disfarça da mesma cor que o envolvente, neste caso, castanho. São normalemnte sujos. Uns dormem com o gado para se aquecerem, outros passam o resto do dia no chão de terra. A maior parte está desempregada. Como não há água normalmente, não tomam banho. Têm um odor insuportável que me deixa a pensar como será no verão com os 45ºC de temperatura média diária.




Aqui não vivem alienados pelos o que os outros possam pensar sobre que trazem vestidos, o aspecto do seu cabelo ou a marca das sapatilhas. São todos iguais, mas importam-se com o que é “importado”. Não sabem o que a metrosexualidade, conceito que nasceu na sociedade consumista à qual eu pertenço, me orgulho e tenho saudade. As pessoas vivem à maneira deles, são felizes assim, mas não deixam de ter o sonho de poder um dia saber o que é a sociedade que se preocupa com essas futilidades.




No Verão a cidade fica sem água durante o dia e não se consegue tomar banho à noite devido às temperaturas elevadas que a água atinge. É estranho, mas quando há água, ela escalda.
A rua central de Guemmar, cidade vizinha, tem uma relva que separa os dois sentidos da estrada. Nessa relva, a que nós demos o nome de “rua dos panascas”, é onde eles passam a vida deitados. Só homens, claro. É extremamente usual as pessoas estarem no chão. Acordam, e vão para o chão, normalmente descalços. Sentam-se no chão, deitam-se no pó como se fosse uma esplanada. Quando anoitece fazem o mesmo mas com uma fogueira para se aquecerem. Mulheres, nem vê-las. Só os olhos! Nesta cidade há uma pequena mesquita, como qualquer outra espalhada pela Argélia, mas esta com uma particularidade. Foi aqui que se fez a maior parte dos recrutamentos de jovens para os atentados suicidas no Iraque, deixando o nome desta cidade associado ao terrorismo.

Gostava de saber escrever, ou melhor, descrever, o que vou vendo por estes lados. Há coisas que se entende, outras que com uma fotografia se tem uma ideia, mas outras, a maior parte, como certos cheiros, paisagens, o dia-a-dia, sabores ou retratos daqueles que me proíbem de fotografar ou filmar, ficarão só para mim, e que inevitavelmente, se perderá na minha memória.

Vou para o terceiro mundo, (ou quarto!) e não sei bem porque o faço. Penso que se não o fizesse, não sabia porque é que não o tinha feito. Simplesmente vou atraído pelo desconhecido, aventura e desafio profissional, magnetizado pela decisão que se acha mais acertada.

Saha!

02/02/2009

Voltei

Primeiro: Quem vier a ler isto, é porque não tem mesmo nada para fazer!



Desta vez a nostalgia que me invade a mente é bastante maior. Desta vez já tenho os contratos assinados, e venho por mais tempo. Já não volta a dar. A decisão está tomada. Vou viver por ano para o deserto do Saara, El Oued
Sigo para a verdadeira Argélia e não para a Argélia onde a maior parte dos expatriados estão – na capital ou arredores no hotel Sherton com restaurantes normais, ocidentais e algum conforto. Eu vou para El Oued, no sudeste do deserto do Sahara, lugar que espelha a pobreza e a religião islâmica que tanto se fala.
Dizem me que é a decisão mais acertada, mas eu penso duas vezes. O tempo não para, mas neste momentos parece que anda ao ritmo de uma tartaruga.


Acordo cedo, abro a janela e vejo que está alto dia. É Janeiro, e uma camisa chega nestes dias.

Fomos para o centro de El Oued e reparei que só agora a fiquei conhecer. O centro é um mercado ao ar livre. Fervilha de vida e tensão. Milhares pessoas aos berros em todas as direcções formigam pelo labirinto de ruas e ruelas sujas das cidade. Toda a gente vende tudo e mais alguma coisa no meio da rua. Uns no chão outros não. Vejo a carne à venda ao ar livre em mesa de madeira lascada e rodeada de moscas, estranho o peixe que as vezes reparo que se vende no meio do deserto e fico baralhado com a quantidade de quincalharia que está misturada com a roupa usada em balcões gastos e sujos. Vou deambulando entre os berros e discussões árabes, entre as burkas, as barbas, a gente escura, os carros, as barracas, as carroças e os burros. A feira é a verdadeira selva. As carroças que passam entre os carros nas estreitas ruas acabam por derrubar algumas barracas. Depois discutem. Imagino perfeitamente uma destes burros a dar um encontrão nos "talhos ao ar livre", a carne cair ao chão (que escuso de descrever), e a voltar a pôr a carne em cima na mesa. São inumeras as situações, no mínimo, diferentes para nós. Nunca tinha visto nada assim, mas eles lá se entendem. La Paz, Peru, ou Marrocos é para meninos! Aqui ninguém fala francês pelo só com o nosso colega Kaddour, conseguimos comunicar, em árabe. Foi assim que compramos as primeiras coisas para a nossa casa.



O centro parece perigoso, mas não é. É só confuso. Sou um estranho para a maior parte das pessoas. Não há um único turista aqui. Aliás, não há uma única agência de turismo ou qualquer tipo de serviço para europeus. Só se fala árabe, a maior parte das lojas está em árabe. Para eles a vida é a Argélia, neste caso El Oued. O mundo acaba ali nas dunas ou nos campos de cultivo que todos parecem ter. Vivem nas condiçoes básicas e não precisam de mais nada. Sobrevivem. Mulheres há muitas, mas estão tapadas e cruzam-se comigo inúmeras vezes. A maior parte delas desvia os olhos, outras até se desviam. Seguem as regras religiosamente, e na minha opinião têm uma vida muito complicada.
É outra realidade, mas são felizes.


À tarde deixo o Paulo no “grande” aeroporto de El Oued (que só tem voos para Argel) e fui dar uma volta pelos arredores de EL Oued por uma estrada entre as dunas do Sahara até uma pequena e típica cidade aqui ao lado já perto da Tunísia. Encontramos com o um amigo do Kaddour, seu irmão e amigos. Agora estava sozinho entre todos os árabes e numa cidade que nunca sequer tinha ouvido falar, sem conhecer ninguém que dissesse uma única palavra em francês, e ainda sem confiança no meu colega que praticamente acabara de conhecer. Senti-me por vezes desconforatével naquela rua de areia com pouca luz entre o grupo de Argelinos mas ia-me habituando. De vez em quando o Kaddour lá ia traduzinho o que se conversava.
O amigo, levou-nos a conhecer umas ruínas árabes datadas do ínicio do seculo 18 rodeadas por palmeiras ainda mais antigas, que orgulhosamente e repetidamente me diz que aparecem no google earth. As casas, com as típicas cópulas para refrescar, feitas em areia, ainda se mantêm praticamente intactas. Imagino a vida dessas pessoas naquela altura. Se neste século, tudo isto parece o inicio do anterior, como terá sido há duzentos anos atrás. De seguinda convida-me para jantar em sua casa. – aceito. Jantei, numa sala cheia de tapetes, televião aos berros, no chão e com as mãos, concluido assim a dificuldade que tive de manhã para arranjar os talheres no mercado. Comida é típica da zona. Cuscus caseiro excelente e claro, só os homens. As mulheres estão proibidas de se sentar na nossa mesa. No fim trazem-nos uma bacia e um jarro, lavo as mãos e bebo o típico chá do deserto.

Admito que me senti meio desconfortavel no início, mas depois conclui que este povo, apesar de porco, selvagem e desorganizado, é hospitaleiro.






No hotel acordo sem stress e vou tomar o pequeno almoço calmamente. Vejo mais uma vez vejo o caco do dono que se passeia de pijama pelo seu hotel. Está acabado, caminha sem levantar os pés, é porco e tem o cabelo oleoso. Esta quase morto, tal como o hotel que gere.
Os jantares são sempre os mesmos neste hotel que se intitula de 4 estrelas (mas que cairam), os quartos estão normalmente sujos e gastos e com falhas por todos os cantos. Mas isso é à parte.


Pegamos na pick-up e fomos fazer a estrada para Biirskra visitar a zona das lagoas onde estão as salinas. Pelo caminho avisto camelos, uns vivos e outros mortos, muitas dunas de areia, pequenas vilas, pastores e as paisagens tipicas do deserto, onde a linha do horizonte se confundo com a areia. A zona das lagoas é espetacular. Metemos pela areia para ir até ao lago, por uma zona que não tem estrada. Lá verifico que esta zona é de facto admirável, digna de um local turístico, e sinto que talvez tenha sido o primeiro português a pisar aquela terra do planeta. À minha volta só constam duas cores. O azul do lag e do céu, e o amarelo da areia.
Continuamos a fazer a estrada e quando avistamos uma cáfila, paramos e fomos até lá falar com o pastor. Este, e todos os argelinos que vi, têm os dentes todos podres. Dizem que é do chá, do fumo, mas eu acredito que seja por não lavarem os dentes. O pastor, ali no meio do nada, olha para mim, oberva-me de cima a baixo. Creio que terá sido a primeira vez que viu ou falou com um europeu. Não sei.

Continuo a viagem pela recta sem fim.
O Kaddour vai-me dizendo que nesta zona do deserto existem uns pequenos petiscos que se chamam trufas, explicando assim o facto do meio do nada avistar duas ou três pessoas. Não exagero quando se anda uma hora sem ver uma única casa, e de repente, aparece duas ou três crianças. Umas delas acenam na estrada lá ao fundo. Ao que parece vendem esse tal petisco, mas quando paramos, percebemos que apenas queriam boleia. Demos boleia a 3 miudos, que todos excitados foram para a caixa da pick-up. Quando os deixamos na vila mais próxima, perguntamos por curiosidade o que tinham dentro do sacos, já que não eram trufas. Dois eles, muitos orgulhosos, metem a mão ao saco e sacam dois ratos, um deles vivo, outro já moribundo dizendo que hoje foram à caça e têm jantar.



Saha!